terça-feira, 15 de junho de 2010

God Save the Queen


Elizabeth II, em 1953.
É comum observar o tom de ironia de comentaristas e telespectadores de competições esportivas quando o famoso "God save the Queen" é entoado, graças ao fato de a versão reduzida destinada às competições repetir várias vezes a frase título - e essa ser, na verdade, a única parte que todos se lembram da canção. Embora nunca tenha sido declarada hino oficial do Reino Unido - onde outros países têm seus próprios hinos, como Escócia e Gales - ou da Inglaterra, a canção foi adotada por prática e costume e sua execução é opcional em eventos não-oficiais, sendo, no caso, executadas outras canções nacionais de igual valor.

O fato do hino nacional tratar apenas do monarca é motivo de estranheza para nós, desacostumados com o conceito de monarquia. O mesmo fato se repete nos Estados Unidos, que fazem piada com os ingleses, entre outros motivos, por sua adoração à Rainha. Nos falta o entendimento de que, para os monarquistas, o soberano não é apenas uma pessoa de carne e osso. Ao entoar os versos de seu hino, os ingleses - e boa parte dos súditos da Commonwealth Realms - não estão rezando pela saúde e longa vida apenas da senhorinha que usa uma coroa, vive num palácio e ganha 20 milhões de dólares ao ano para seu sustento e sua família (também conhecida como Sua Majestade Elizabeth II, pela Graça de Deus, Rainha do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte e de Seus outro Reinos e Territórios, Chefe da Commonwealth e Defensora da Fé), estão também exaltando tudo o que a Rainha representa. E o que ela representa? A monarquia.

Henry VIII (1491-1547).
Embora pareça estúpida, esta resposta é a mais objetiva e acertada que se pode dar. Há de se entender, no entanto, a importância da monarquia na sociedade inglesa/britânica, que desde seus primórdios - datados do século X - é governada por soberanos. Trata-se de uma Instituição pré-feudal que sobreviveu às inúmeras reviravoltas no cenário político europeu, viveu o Feudalismo e hoje existe como Monarquia Parlamentarista. Portanto, o soberano britânico é, em última instância, a continuação de seu reino enquanto Nação, seus valores e cultura. 

Em pesquisa encomendada pelo The Sun em 2006, 72% da população adulta britânica optarou pela monarquia em detrimento da república (18%), quando perguntados qual regime preferiam para seu país (10% não opinaram); ainda, 85% se disseram satisfeitos com a Rainha enquanto monarca e 64% afirmaram que ela nunca deveria se aposentar, quando perguntados "em que idade, se tiver que, a rainha deveria se aposentar? Aos 80, 85, 90 ou nunca?".

Desde a transição para monarquia constitucional - estabelecendo Leis às quais o soberano também é submetido - o papel do rei ou rainha foi gradativamente reduzido, lhe sendo reservado uma pequena parcela de poder direto - embora, entenda-se que os poderes Legislativo (Parlamento), Judiciário e Executivo (Primeiro Ministro) emanem do Soberano.

Cena do filme "The Queen"
Nas palavras do constitucionalista inglês Walter Bagehot, ao soberano cabe a "parte digna" e aos demais poderes, sobretudo ao Parlamento, cabe a "parte eficiente". Em seu livro "A Constituição inglesa" de 1867, Bagehot diz sobre o sistema democrático americano: "O executivo é aleijado por não ter as leis que precisa e o legislativo é mimado por poder agir sem responsabilidade: o executivo deixa de ser apto a seu nome, uma ves que não pode executar o que decide; o legislativo é desmoralizado pela liberdade, por tomar decisões cujos efeitos, outros, e não si mesmos, sofrerão os efeitos".

A grande virtude da monarquia é o fato de o poder do Chefe de Estado não estar limitado a um dado limite de tempo ou à aprovação popular - que em muitos casos levam a péssimas decisões estratégicas. De forma que políticas anti-populares, mas necessárias à Nação, sejam tomadas e haja estabilidade e continuidade em projetos de longo prazo (como educação e previdência social), coisa que parece impossível em regimes presidencialistas, tanto no Brasil como em outros países.

Não se está falando em ditadura ou poder absoluto, mas sim num governante submetido à lei, que não pode ter seus interesses comprados, pois seu poder não depende de sua riqueza e, no caso da maioria dos soberanos, já é rico por herança (a rainha Elizabeth II possui £174 milhões em propriedades, ações, obras de arte, peles e cavalos, afora o custeio de seus gastos pelo governo britânico, da ordem de US$20 milhões anuais).

Não sou, pessoalmente, contrário ao regime presidencialista, tão pouco a favor de que a monarquia volte ao Brasil - embora alguns brasileiros o queiram -, essa opção está fora de questão desde o Plebiscito de 1993, onde a república foi definida como forma de governo - com 49% dos votos - e o presidencialismo como sistema de governo, tendo 41% dos votos (veja mais aqui). A monarquia constitucional funcionou, e funciona, bem para o Reino Unido, mas não há como se argumentar se funcionaria no Brasil, como pretende a dita "Família Imperial", pois trata-se de realidades completamente diferentes.

É possível, claro, que se estabeleçam políticas de longo prazo no Brasil, tais como as tomadas na Inglaterra anos atrás, buscando um estado de bem estar capaz de gerar qualidade de vida e altos índices de desenvolvimento humano. O caminho, no entanto, é mais longo, sendo preciso que se defina metas  de longo prazo que atendam aos interesses da Nação a serem seguidas independentemente de quem está no poder

Parafraseando Winston Churchill, eu diria: ninguém pretende dizer que o sistema político brasileiro é perfeito, na verdade, tem sido dito que é o pior possível, exceto por aqueles que tentamos antes.




Veja também:


Elizabeth II [Wikipedia]
United Kingdom [Wikipedia]
God Save the Queen [Wikipedia]

Filme: The Queen - Altamente recomendado!

1 comentários:

Ulisses Vasconcellos disse...

Ano passado o "príncipe imperial" do Brasil foi a São Mateus e eu escrevi a matéria sobre a vinda.

Segundo ele, quando o Brasil deixou de ser monarquia, foi acordado que seriam feitos dois plebiscitos. O primeiro foi feito em 1993 e, logo, ainda segundo ele, ainda há um segundo a ser feito para que se possa afirmar que o Brasil não será mais monarquia.

Ele se denomina "príncipe imperial", já que o príncipe mesmo, conforme a ordem de sucessão seria o irmão mais velho.

Acho bacana a monarquia nos lugares onde ela funciona. Dá um tom clássico ao país.