quinta-feira, 11 de março de 2010

Quem tem medo do lobo mau?

Raúl Castro e Lula, em visita a Cuba
No fim de fevereiro passado o prisioneiro político cubano Orlando Zapata morreu, aos 42 anos, após 85 dias em greve de fome. A morte do dissidente do regime dos Castro coincidiu com a visita do presidente Lula ao país. Quando perguntado a respeito, o presidente assumiu optou por não discordar da posição de seus anfitriões em relação aos direitos humanos e à democracia, mas mostrou-se consternado pelo acontecido. O que popularmente pode ser chamado de 'ficar em cima do muro'.

Posições semelhantes por parte do governo brasileiro em relação a outros países têm sido alvos da crítica internacional, que vê as relações diplomáticas do governo brasileiro com os de Cuba, Venezuela e Irã como amigáveis demais. Se esperava que o Itamaraty pressionasse esses países a cumprir resoluções das Nações Unidas, a se abrir politicamente ou a prezar pela liberdade de imprensa. O governo brasileiro, no entanto, prefere se fingir de desentendido e fazer vistas grossas aos problemas internos de outros países, em favor dos interesses comerciais e diplomáticos do Brasil com os mesmos. E o governo está certo.

Fidel, Chavez, Ahmadinejad e Saddam
A ideia que países, como os Estados Unidos, tentam passar é que Cuba e Irã são a personificação do Mal na Terra enquanto os países ocidentais e/ou capitalistas representam o Bem. Essa visão simplista e dicotômica do mundo é ridícula. O ser humano é movido por interesses, sejam financeiros, emocionais, políticos ou físicos, e inevitavelmente vai visar os próprios ante os dos demais. Isso serve pros 'mocinhos' americanos, 'comunistas-comedores-de-criancinhas' cubanos, projetos de ditadores latinos ou extremistas islâmicosEstão todos tentando puxar a sardinha pra própria brasa.

Como é possível que um país que deu suporte às ditaduras da América Latina na década de 60 possa julgar o regime cubano? Tanto Pinochet quanto Fidel Castro puseram inimigos políticos no paredão, a diferença é que o primeiro estava no "bolso" deles e o último não. O que torna a ditadura em Cuba tão perversa é o fato de não ser "american approved".

Primeira Guerra do Golfo - 1980-1988
Agora, quando se trata de Chavez e Ahmadinejad os problemas são outros; eles são acusados de deturpar os valores democráticos, conduzir seus países a uma corrida armamentista e de manipular as massas para garantir poder vitalício. São motivos mais que suficientes pra se tornarem inimigos do Tio Sam, certo? Errado. Saddam Hussein foi amplamente apoiado pelos Estados Unidos na década de 80 em sua guerra contra o Irã pela supremacia no Oriente Médio, o mesmo Saddam que anos mais tarde foi deposto pelos próprios americanos e, posteriormente, sentenciado à morte na forca por crimes de guerra. Entre os crimes pelos quais foi condenado está um ataque aos curdos - minoria étnica e nação apátrida que vive em regiões de Irã, Iraque, Síria e Turquia - em 1982.

Também nos anos 80, quando o Afeganistão lutava para se libertar da invasão russa, os americanos forneceram armas e treinamento militar ao grupo que liderava a resistência afegã, os mujahidin. Dez anos mais tarde, após a retirada russa, uma das facções internas dos mujahidin ascende ao poder, os talibans. O Taliban instalou um regime extremista islâmico no país e se opôs aos Estados Unidos. Em 7 de outubro de 2001, vinte e quatro dias após os atentados atribuídos à Al-Qaeda, tem início a invasão americana ao país, sob o pretexto de caçar Osama Bin Laden.

Como se vê, o conceito de quem é "bom" e quem é "mau" depende, exclusivamente, dos interesses envolvidos. Então, se o aspecto moral é totalmente ignorado por outro países quando é conveniente, porque nós seríamos diferentes? O fato é que o mundo não é preto ou branco, bom ou mal. Seria inocência do governo brasileiro comprar um briga que não é sua quando seus próprios interesses estão em jogo. E quais são os do Brasil em relação a Irã e Venezuela, por exemplo?

Soja brasileira - 99,57% do mercado iraniano
Pra ficar apenas no âmbito econômico: o Irã importou, em 2007, aproximadamente US$1,5 bilhão em milho, óleo de soja e açúcar brutos, carnes bovina e de frango, e outros subprodutos de soja. - sendo que a participação brasileira no mercado iraniano destes produtos é de 84,77% do total. O produto iraniano com maior expressão na importação brasileira é uva seca, com a irrisória soma de US$1,7 milhão no mesmo ano. Naquele ano, o Brasil importou US$11 milhões e exportou US$1,8 bilhão para o Irã, um superávit comercial mais que positivo.

As relações comerciais Brasil-Venezuela são ainda mais favoráveis. Ainda em 2007, US$4,7 bilhões em produtos brasileiros foram exportados enquanto apenas US$346 milhões foram importados em bens venezuelanos. Produtos como soja, acúcar e derivados de leite produzidos no Brasil representam em torno de 75% de seus respectivos mercados na Venezuela. Entre os anos de 2003 e 2007, a exportação brasileira para a Venezuela cresceu, em média, impressionantes 66,9% ao ano.

Motivos para que as relações com tais países se mantenham, portanto, há de sobra e o governo brasileiro deve buscar fortalecê-las. Acredito também que o Brasil deve se posicionar, sim, a favor dos direitos humanos, da democracia e da liberdade expressão, mas sem que isso comprometa as relações, não só comerciais, existentes com outros países. Apontar dedos e criar inimigos não é vantagem pra ninguém.

Fonte dos dados econômicos: Intercâmbio Comercial do Agronegócio - Principais Mercados de Destino. Edição 2008. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

2 comentários:

Ulisses Vasconcellos disse...

Cara, acho que esse foi o melhor texto que eu já li seu.

Coerentasso.

Só não entendi porque a postagem acima "foi removida pelo administrador do blog". Ditadura aqui?

hehehehe

Régis André disse...

A Josi tinha comentado n sei oq, acho que no lugar errado, aí eu removi... haha! Com o conhecimento dela... =)

Agora eu que eu vi como excluir definitivamente e não deixar aparecer que foi excluído. Mas prometo não usar para fins ditatoriais...